Diário do Amapá - 05/08/2020
LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANA MELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br / / esde novembro, a morte do apresenta- dor Gugu tem trazido questõesbastante polêmicas que vêm sendo discutidas no Direito de Família e Sucessões Brasileiro. A existência de um contrato de geração de filhos pode afastar o reconhecimento de uma união estável? O companheiro pode ser excluí- do da herança através de um testamento? Podem existir uniões estáveis simultâneas? Conforme noticiado pela mídia, Gugu ela- borou, em 2011, um testamento reconhecendo apenas os seus três filhos como os seus únicos herdeiros legítimos, excluindo a sua suposta companheira RoseMiriam de sua herança. Em relação à parte disponível de seu patrimônio, que corresponde à 50% de seus bens, o apre- sentador dividiu entre os seus filhos e sobri- nhos, que são filhos de sua irmã Aparecida Liberato. Além disso, estabeleceu que sua mãe receberia de forma vitalícia a quantia de R$100 mil reais mensais, bem como o usufruto do imóvel que reside e que era de propriedade de Gugu. Por fim, nomeou a sua irmã Aparecida como inventariante e curadora dos bens her- dados pelos filhos de Gugu, impedindo, de for- ma explícita, que Rose Miriam administre os bens de suas filhas menores. A leitura do testamento diante dos familia- res de Gugu causou um enorme mal estar fami- liar. Rose Miriam sentiu-se injustiçada por ter sido excluída da herança e acio- nou a justiça brasileira para pleitear os seus direitos, apresentando algu- mascartas, fotos e áudios para provar a união estável. Por sua vez, os fami- liares de Gugu alegam que Miriam não era companheira dele e apresen- taram um contrato de geração de filhos celebrado entre Gugu e Rose Miriam no passado. Nesta quinta-feira (7), alguns portais de notícia publicaram que o chef de cozi- nha Thiago Salvático acionou a Justiça para que também fosse provada sua união estável com o apresentador. No processo protocolado na 9ª Vara de Família de São Paulo e Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo foram anexadas algumas provas, como: com- provantes de viagens, fotos, registros de con- versas em aplicativos, investimentos adminis- trados pelos dois e até mesmo contas de servi- ços de streaming que Gugu e Thiago compar- tilhavam. O Código Civil Brasileiro diz que para ser reconhecida a união estável deve haver uma relação entre duas pessoas (mesmo sexo ou sexo oposto), pública, contínua e duradoura com o objetivo de constituir família. Pelas informações noticiadas pela mídia, Rose Miriam se relacionou com Gugu por 19 anos até a sua morte, além de ser a mãe biológica dos três filhos do casal. Ademais, o casal apareceu junto em diversas capas de revistas nacionais como se formassem uma família. Já Thiago alega que se relacionou com Gugu por mais de sete anos e que há três levavam uma vida conjugal. Ocorre que a Justiça levou em con- sideração o contrato de geração de filhos realizado entre Gugu e Rose Miriam e estabeleceram uma pensão ali- mentícia de R$ 100 mil por mês em janeiro deste ano, decisão que foi derrubada em feve- reiro, alterando o valor estabelecido para cerca de R$ 42 mil. E o que vem a ser esse contrato? Apesar desse contrato não estar regulamen- tado no Brasil, sendo bastante comum nos Esta- dos Unidos, muitos advogados defendem a sua validade jurídica, ao argumento de que as pes- soas têm o direito e a liberdade de afastar o afeto das suas relações pessoais. Assim sendo, o afeto permanece somente em relação aos filhos, havendo uma relação parental (entre pais e filhos) e não uma relação conjugal (entre os pais). Uma vez sendo válido esse contrato não poderia a união estável ser reconhecida. a última semana os índices de adesão à quarentena vigente em todo o Brasil caíram vertiginosamente, preocupando Governadores, Secretários e Prefeitos de diversas regiões do País. Alguns deles, inclusive, anunciaram que medidas mais drásticas para conter a curva de avanço da pandemia COVID-19 poderiam ser adotadas. Isso porque, segundo o ex-Ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, o pico da contaminação ocorrerá entre maio e junho. No meio desse imbróglio pandêmico que vem causando pânico mundial, após diversas personalidades se declararem portadoras da doença, dentre elas o Primeiro-Ministro Bri- tânico, Boris Johnson, e os renomados médi- cos brasileiros, David Uip, infectologista res- ponsável pelo combate à pandemia no Estado de São Paulo, e Roberto Kalil Filho, diretor clínico do InCor e chefe do Centro de Cardio- logia do Hospital Sírio-Libanês, surge a notí- cia de que dois Governadores, um do Sudeste (Wilson Witzel – Rio de Janeiro) e outro do Norte (Helder Barbalho - Pará), também con- traíram a doença. Em outras palavras, os exemplos eviden- ciam que ninguém está protegido e muito pro- vavelmente o pico da contaminação ainda está por vir. Por esse motivo, se a adesão ao isola- mento social não voltar aos patamares tidos como aceitáveis pela OMS, o lockdown ou confinamento obrigatório – como aconteceu na Espanha e na Itália – é uma medida de defe- sa já adotada pelo Rio de Janeiro, Pará, Tocan- tins, Amapá, Roraima e Paraná, sendo estudada para ser adotada em outras regiões do país. Instituída essa medida severa de isolamen- to social, prisões em flagrante podem ocorrer contra qualquer pessoa que descumprir as regras previstas em Decreto complementar ao artigo 268 do Código Penal, o qual estipula que aquele que “Infringir determinação do poder público, destinada a impe- dir introdução ou propagação de doença contagiosa” poderá ser puni- do com detenção e multa. Mas quem pode impor o lock- down? Quais seriam essas “determi- nações do Poder Público” que pessoas não podem transgredir? Como o Brasil é muito grande e por isso os problemas e as formas de enfrentamento de doenças podem ser distintos de uma região para outra, o legislador, ao escrever o artigo 268, optou por deixar seu texto proposital- mente com lacunas, tornando-o uma norma penal incompleta. Essa norma penal em branco, como é conhecida pelo mundo jurídico, serve, no caso do artigo citado, para que o Poder Público – representado pela União, pelo Distrito Federal, pelos Estados e pelos Municípios – possa esti- pular regras para impedir o alastramento de doenças contagiosas de acordo com as neces- sidades de cada região. O artigo 268 do Código Penal é um crime de menor potencial ofensivo. É cabível prisão em flagrante nesse tipo de delito? A Lei nº 9.099/1995 – Lei dos Juizados Especiais, que trata dos crimes de menor poten- cial ofensivo, assim entendidos os delitos cuja pena máxima é igual ou inferior a dois anos, não proíbe que seja dada “voz de prisão em flagrante” ao infrator no momento em que este estiver cometendo o crime. A lei estipula apenas que, se após a lavratura do termo circunstanciado pelo Delegado de Polícia o trans- gressor for imediatamente encami- nhado ao Juiz, e perante ele assumir o compromisso de comparecer ao Fórum quando for convocado, a pri- são em flagrante não será ratificada judicialmente e o suposto transgres- sor poderá ir para sua casa. Aliás, vale destacar que qualquer cidadão pode dar “voz de prisão em fla- grante” àquele que estiver cometendo um crime (art. 301, Código Penal). Em resumo, se a adesão ao isolamento social voluntário não voltar a ser praticada pela maio- ria da população, as regiões mais críticas do País serão obrigadas a determinar o lockdown como forma de garantir que as pessoas se reco- lham em suas casas, sob pena, até, de prisão em flagrante em caso de descumprimento. E isso não poderá ser interpretado como um ato repressivo de afronta ao direito de liberdade de locomoção, pois a preservação da vida será o bem mais precioso que o ato de confinamento obrigatório estará protegendo. Vale lembrar que estando imposto o lock- down, em caso de prisão, é importante que o cidadão não tente resistir ou se rebelar contra o autor da ordem, pois isso poderá acarretar o cometimento de outros crimes, como por exemplo, o de resistência a prisão (art. 329, Código Penal), o de desobediência (art. 330, Código Penal) ou o de desacato (art. 331, Código Penal).
RkJQdWJsaXNoZXIy NDAzNzc=