Diário do Amapá - 16 e 17/02/2020

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANA MELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br / / mmarido foi visitar um santo eremita para pedir algumconselho, a respeito da difícil convivência com a esposa. O eremita escutou com benevolência todas as queixas do homem, depois deu o seguinte conselho: “Irmão, os defeitos da mulher, ou se corrigemou se suportam. Quemoscorrige, melhora a esposa, quem os suporta melhora a si mesmo!” Neste domingo e no próximo, continua- mos a leitura do quinto capítulo do evangelho de Mateus. Nele, Jesus é apresentado como alguém que, pela própria autoridade, faz a releitura dos mandamentos da lei dada por Moisés. A cada assunto se repetem as pala- vras: “Ouvistes o que foi dito...”, “Eu, porém, vos digo”. É, justamente este “eu” que deve chamar a nossa atenção. É ele, Jesus, que fala e nos diz claramente que não veio para “abolir” a lei e os profetas, mas, ao contrário para dar-lhes pleno cumprimento (Mt 5,17). Já ficamos, espero, curiosos: não era a lei o sinal e o compromisso daAliança entre Deus e o povo escolhido? O que faltava à lei? Devia continuar a ser praticada e ensinada (Mt 5,19), no entanto, Jesus põe como con- dição para entrar no reino de Deus uma jus- tiça maio” do que a dos fariseus e dos mestres da lei. Nós já sabemos a resposta. Não basta cumprir os preceitos da lei ao pé da letra, precisa ter a coragemde reconhecer comqual ânimo e com qual coração fazemos isso. A Deusnão interessamtanto pessoas obedientes só no mínimo necessário; ele quer amigos sinceros que, alegres e livremente, construam relações de paz, bondade, partilha, amor para com ele e com o próximo. Ou seja, segundo as palavras de Jesus, o Pai quer “filhos” cujo coração bata em comunhão com o dele, sempre bondoso e misericordioso para com todos, bons e maus, justos e injustos (Mt 5,45). Pensando bem, tudo isso é uma verdadeira viravolta ou revolução, se preferem. Os cristãos devem obedecer à única lei do amor que nos torna livres das amarras do egoísmo e das negociações de quem faz as cois as – o bem - somente se tiver alguma vantagem em troca. As propostas de Jesus são de uma atuali- dade impressionante. Vivemos um tempo de violência, exercida, muitas vezes, em nome da segurança e de direitos, alguns honestos, mas outros negados ou roubados de irmãos e irmãs mais fracos e pobres. Émais fácil se encolerizar que buscar entendimento e recon- ciliação. Acontece nas nossas famílias. Em nome da felicidade individual, jogam-se fora as promessas, as juras de amor, o futuro dos filhos e de quem - o cônjuge - partilhou anos e anos de alegrias e dificuldades, numa ver- dadeira comunhão de vida. Adultério é pala- vra pesada, mais fácil são a indiferença, o descaso ou a acomodação, as “saidinhas” e situações de fachada. Para que o casamento não se torne uma triste e inútil prisão, o amor deve ser alimentado, renovado, reavi- vado sempre, comcorageme abnega& ccedil;& atilde;o. Omais difícil, tal- vez, seja se deixar moldar pelo outro ou pela outra, corrigir os autorita- rismos, desmascarar o machismo e o feminismo, acreditar no diálogo e desistir da pressa de mudar os outros, antes de mudar a nós mes- mos. Enfim, o evangelho fala de “Não jurar o falso”. Em época de fake-news, a coisa mais fácil, hoje, é espalhar notícias falsas ou de origem duvidosa ou desconhecida. Sobretudo quando uma mensagem nos parece “impor- tante”, porque escandalosa ou tocante, logo a multiplicamos. Depois, ficamuito difícil voltar atrás e reconhecer a mentira e o uso do sofri- mento alheio por parte de pessoas inescrupu- losas. A honestidade das pessoas ficou man- chada para sempre e o ditado popular: “onde tem fumaça, tem fogo” gera suspeitas e des- confiança. Não gostaríamos que isso aconte- cesse conosco, e por que ajudamos para que aconte&cce dil;a co m os outros? Também espalhar notícias dizendo que foi, me perdoe, Nossa Senhora, ela mesmo, Maria a falar é, no pouco dizer, ousado ou até desrespeitoso. Quem garante que foiMaria mesmo que disse aquilo? Nossa Senhora pode ameaçar pragas para os seus filhos? Comcerteza, ela nos exor- ta a crer mais, rezar mais e a sermos maisbon- dosos, a não ter medo e a “fazer” sempre “tudo” o que Jesus nos disser (Jo 2,5). oje, com o mundo digital, temos uma nova revolução da comunica- ção e da convivência. Tenho a impressão de que os principais responsá- veis da evangelização não tomaram cons- ciência dessa nova cultura, que não é um prolongamento da cultura passada, mas uma mudança total. Continua-se, por exemplo, evangelizando e praticando uma vida litúrgica teológica-eclesial com uma linguagem totalmente estranha a essa nova cultura. É comum ouvir em ambientes eclesiásticos como é importante o uso dos meios digitais em vigor, mas não percebem o novo modo de ser e nem refletem ou estudam o que esses produzem. Os meios digitais redefiniram, de maneira radical, o relacionamento psico- lógico de uma pessoa com o espaço e o tempo. Por exemplo, a pessoa, nesse novo contexto cultural-digital, não é paciente, não sabe esperar, é imediata, além disso, está ligada com o mundo todo, sem fron- teiras. A cultura digital harmoniza pala- vras, sons e imagens simultaneamente. Não só. Esse novo jeito de comunicar dá sentido a tudo. Numa cultura digitalizada não há espaço para uma vivência apática. É sempre técnica e proje- tada além dos próprios confins. Se vive em uma constante tensão entre o real e o irreal. Na cultura digital, o pensa- mento não pode ser freado ou contido, mas se desencadeia sem limites. Eu me pergunto, enquan- to membro da Igreja: como anun- ciar Jesus nesse novo mundo, isto é, como se tornar mais eficaz a Pala- vra de Deus? Aqui não se pode impro- visar nada, mas precisa uma reflexão e planejamento sério, que conheça profun- damente essa nova cultura. Precisa conhe- cê-la por dentro, porque, sem isso, pode- mos nos iludir e fazer ummau uso do meio digital. Pergunto-me: até que ponto os membros da Igreja estão preparados para essa nova cultura que está tomando conta da nossa realidade? Podemos também nos perguntar: há lugar para Jesus? É verdade também, se não tem espaço para Jesus, o ser humano não terá espaço. Vimos que a cultura digital é infinita, sem limites. Os valores e os con- ceitos de como se viviam no passado não têm espaço na atual cultura. Por isso, constatamos também uma ins- tabilidade sociopolítica e, ao mes- mo tempo, o reforço e o poder do imaginário. A Igreja se quiser realmente evangelizar tem que passar por tudo isso, saber filtrar a sua comunicação através desses elementos que constituem a nova cultura digital. É para conhecer tudo isso, repito, não se pode improvisar, mas precisa estudar muito, refletir bas- tante e ser verdadeiros observadores dessa nossa convivência. Nunca esqueço as pala- vras do finado cardeal Martini quando me disse que para saber lidar com o novo mundo é necessário estudar muito. Portanto um líder da Igreja, por exemplo, não pode ficar satisfeito em conhecer somente a doutrina, mas é também impor- tante como comunica-la, numa cultura que se evapora com tanta facilidade. Assim sen- do, não podemos pensar com superficiali- dade essa nova cultura, minimizando-a, mas precisamos reconhecê-la como expressão viva das sociedades atuais.

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