Diário do Amapá - 28/02/2020

/ / / / / Na noite de Réveillon de 2014, a carioca Carina Seixas, então com 32 anos, parou para pensar nas promes- sas que faria para o ano que começa- va. Mas nada a atraía. Nem mesmo a recente decisão de largar o emprego de designer para montar um negócio próprio. Foi quando ela se lembrou da pai- xão que nutria na infância pelo velei- ro que seu pai tinha e teve a ideia de mudar radicalmente de vida. Pronto. Era isso que ela faria: iria morar num barco. E sozinha – coisa ainda rara para uma mulher no Brasil. Hoje,aos36, jáfazquatroanosque Carina trocou um modesto aparta- mento na Ilha do Governador, no Rio de Janeiro, por um pequeno veleiro e não se arrepende. Nem se vê voltan- do a viver num apartamento. "Morar num barco significa ter pouco espaço,ficar balançandoquase o tempo todo e abrir mão de certos confortos,como, por exemplo, terum guarda-roupa cheio de roupas, mas, nomeucaso, temvalidomuitoapena", resume Carina, que hoje vive apenas do aluguel doapartamento onde antes morava."Morar numbarconão éape- nas mudar de casa", avalia. "É mudar de vida". O atual barco de Carina (no come- ço,elateveoutro,menorainda),oCri- loa, de 1975, tem pouco mais de dez metros de comprimento, um quarto, uma sala,umbanheiro euma cozinha. "Nobarco,eudescobri quepossoviver bem com bem pouco, desde que este pouco seja realmente valioso para mim. Também aprendi a dar valor a tudooquetenho,mesmoque seja pou- ca coisa", diz Carina, com uma fala sempre pausada, tranquila e reflexiva. "As pessoas estranham, mas não existe nada de heroico no que eufaço. Até porque pouco navego", explica Carina, que, depois de uma tempora- da na Ilha Grande, no Rio de Janeiro, hoje "mora", na Praia de Santa Tere- sa,em Ilhabela,no litoral de SãoPau- lo, onde o seu barco está atualmente ancorado. "Meu veleiro é basicamen- te a minhacasa,não ummeiopara sair viajando mundo afora, embora, com ele,eu também possafazer isso", ana- lisa.Ecompleta:"Quem sabe,umdia". "De vez em quando, gosto de mudar de 'endereço' e um barco faci- lita muito isso", explica. "Também consigo 'morar' em lugares legais, sem precisar pagar por isso.Mas,para mim,o melhor de tudoé a paz,a liber- dade e a integração com a natureza que morar num barco permite. Foi a melhor resolução de Ano-Novo que eu poderia ter tido". Medo? Ela garante que não tem. "Me sintosegura no meubarcoe sem- pre tenho um ou outro vizinho nos locais onde paro. E a gente se visita, convida o vizinho para um café, coi- sa que nunca fiz quando morava num apartamento no Rio", exemplifica. Solidão? Ela também jura que não sente. "Me dou bem comigo mesma e gosto de ficar sozinha. Mas, se um dia aparecer um namorado, ele será bem-vindo no barco", brin- ca Carina, que preenche seu tempo lendo, fazendo a manutenção básica do veleiro, passeando nas regiões onde ancora ou cozinhando, embo- ra o seu barco não tenha nem gela- deira. Apesar de seguir feliz com a vida que decidiu experimentar a partir daquele Réveillon de quatro anos atrás, Carina prefere não fazer pla- nos para o futuro. "Só acho que não consigo mais voltar a trabalhar num escritório", diz. "Não sei se vou morar para sem- pre num veleiro, mas estou gostan- do muito de viver no mar, e isso, por enquanto, é o que importa para mim", diz, repetindo o mesmo racio- cínio de quase todo mundo que deci- diu trocar uma casa por um barco, a fim de aproveitar a vida, ainda que com muito mais simplicidade. Como o jovem casal Aline Sena e Adriano Plotzki, que, no mês passado, também se mudou para um veleiro (clique aqui para conhecer a história deles) e, neste momento, já viaja pela costa bra- sileira. "Talvez, um dia, eu faça isso também", diz Carina.

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