Diário do Amapá - 07 e 08/06/2020

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANA MELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br / / Um sacristão ligava, todos os dias, para uma emissora de rádio da sua cidade para saber a hora exata. Certo dia, um dos operadores da rádio, intrigado, quis saber por que ligava para lá todos os dias. – Quero estar certo com a hora de meio dia, quando devo tocar os sinos da torre. Respondeu o sacristão. – Mas como? Rebateu o operador: - Eu regulo o relógio da Rádio com o toque dos sinos! Afinal, quem regulava quem? Quem estava certo e quem errado? A conclusão é simples: todos precisamos de alguma coisa, ou de alguém, que nos faça sentir seguros, certos. Não para sermos dependentes, mas para ter alguma referência e não ficarmos perdidos na incerteza ou fechados na nossa orgulhosa e falsa infalibilidade. Na primeira semana após Pentecostes, a Liturgia nos convida, todo ano, a celebrar o Domingo da Santíssima Trindade. Ésempre uma oportunidade para refletir sobre algo de tão grande emisterioso que, com certeza, está acima do nosso pequeno entendimento. Não estou falando, porém, da nossa inteli- gência. No meio da humanidade, em todos os tempos e em todos os lugares existiram, e existem, grandes gênios, mas aqui não se trata disso. Nem é questão de ter estudado mais ou estudado menos. Oque nós cristãos sabemos é o que, acreditamos, foi-nos reve- lado pelo próprio Deus. Com Jesus, ele, Deus, nos deixou “espiar” um pouco da sua intimidade. O Filho feito homem, Jesus, dis- se que ensinava tudo o que tinha ouvido do Pai e que tudo o que era do Pai era também dele (Jo 16,13- 15). Por sua vez, sempre o Filho, disse que o Espírito Santo teria lembrado “tudo” o que ele, o Filho, tinha ensinado, ou seja, nada mais disso. Dito em forma simples – e banal, me perdoem -: o Pai não tem segredos para o Filho e o Filho não tem segredos para o Espírito Santo. Todos se conheceme se entendemmaravilhosamente. Quando algo semelhante acontece entre nós humanos, chamamos isso de amor, por- que somente quem ama não tem nada para esconder e pode abrir totalmente o seu cora- ção à pessoa amada. Sabemos disso desde as mentirinhas de crianças. Depois, cresce- mos, e, infelizmente, aprendemos a mentir, fingir e enganar. Na incerteza criamos defe- sas, alimentamos desconfianças, cultivamos suspeitas. Muitas vezes, temos medo de amar, ou de tomar decisões importantes, porque temos receio que alguém nos mani- pule e aproveite da nossa boa-fé. Na primeira carta de João lemos diferente: “No amor não há temor” (1 Jo 4,18). Em Deus Trindade a comunhão de amor é perfeita, a confiança é total, não há divisão, é um único Deus. É verdade que o Filho “obedece” ao Pai, mas, custe o que custar, o faz com adesão livre e absol uta. O E spírito também não “pensa” diferente. Nos ajuda a pro- clamar que “Jesus é o Senhor” e ora conosco o Pai. Tudo e sempre com amor e por amor, que afinal é a úni- ca verdadeira liberdade. Somente assim ninguém depende de nin- guém porque todos comungam da mesma vontade, do único projeto de amor e misericórdia em nosso favor. Nós humanos, pobres coitados, pecadores, esquecidos e ingratos. Quantopoderíamosaprendermeditando sobre o “mistério” da Santíssima Trindade! Entre nós funciona diferente, já sabemos. Estamos doentes para receber aplausos. Nos achamos importantes quando temos “segui- dores” nas redes sociais. Bebemos avidamen- te de frases estrondosas quando pensamos que “todos” estejam gritando omesmo. Espa- lhamos notícias “compartilhadas” por milha- res ou milhões sem saber se vale a pena ou se é verdade. Émais cômodo repetir os outros que refletir com a nossa cabeça e decidir com a nossa vontade e responsabilidade. Claro que precisamos de lideranças, mas não de qualquer jeito ou somente para nos eximir das consequências das nossas escolhas pes- soais. Jesus nos quer livres, capazes de cola- borar entre nós, unidos e fraternos. A meta é a comunhão de amor. Temos um longo cami- nho a percorrer. E o relógio? Ainda bem que agora a hora certa vem pelo celular. Liberdade ou dependência? s italianos estão enfrentando a covid- 19 com todas as precauções possíveis. Não estão brincando em serviço. Inclusive, todos os sacerdotes da região do nordeste da Itália tiveram de fazer o teste para não deixar dúvidas sobre a presença ameaçadora do novo coronavírus. A seve- ridade de controle é tão minuciosa que eu mesmo estou experimentando. Uns dez dias atrás, almocei com dois sacerdotes e, no dia seguinte, fui fazer o teste, que resultou negativo. Porém, um padre com quem almocei testou positivo cinco dias depois. Resultado: tive de passar também para a quarentena. Uma quarentena que me obrigou a permanecer em casa, sem receber visitas. E ainda tenho de controlar a temperatura duas vezes ao dia, suspender todas as atividades, inclusive as celebrações, manter a higienização do local e separar o lixo, que não pode ir naquele comum. Ao mesmo tempo, sou vigiado por tele- fone, além de ter a clausura controlada dia- riamente pela polícia. Tudo isso porque esti- ve perto de um contagiado. Este vírus, tão poderoso, determina a nossa vida e a nossa convivência. Este tipo de comportamento é ditado porque, efetivamente, não o conhecemos e, portanto, não sabe- mos ainda agir clinicamente. Nesta quarentena, me vieram a tona umas simples reflexões, relembrando a Sagrada Escritura. Não sei se você se lembra dos leprosos no tempo de Jesus? Naquele tempo, a sociedade não conhecia a doença e a única solução era segregar o doente do convívio social para evitar mais contágios. Assim sendo, o pobre leproso, além de sofrer a doença sem expectativa de vida, tinha que enfrentar o sofrimento de estar longe de seus familiares e amigos. Total- mente abandonado. Por causa desta igno- rância da medicina, continuam esses com- portamentos exclusivos. Eu me sinto nesses dias quase como um perigo público. Por exemplo: têm pessoas que chegam à porta da minha casa e, natu- ralmente, aviso da minha quarentena e logo elas dão um passo atrás. Este é um pequeno exemplo de como posso ter me tornado um perigo. Por isso, sinto-me assimmuito aban- donado. Além do mais, as pessoas que me trazem os alimentos devem deixa-los a uma boa distância para evitara apro- ximação e o possível contágio, embora eu não tenha o vírus, mas esteve próximo de um que o teve. Sinto-me realmente só, humana- mente falando. A minha sorte é a minha expe- riência de fé que me permite inten- sificar o meu estado de oração. É isto queme dá capacidade de dialogar com Deus e fazer uma experiência efetiva da ação do Espirito Santo na minha pobre vida. Experimentar como o Espirito da Ver- dade me ajuda a relembrar as Palavras vivas de Jesus no momento certo pra ação certa. Lembro-me da passagem do evangelistaMar- cos: “Ao desembarcar, Jesus viu uma grande multidão e compadeceu-se dela, porque era como ovelhasque não têm pastor. Ecomeçou a ensinar-lhes muitas coisas.” A Palavra me ajuda a refletir e compreen- der que a compaixão de Jesus com as pessoas significa a presença de Deus em nós. Istome conforta e me faz sonhar a grandeza da nossa Vida que não é limitada por qualquer preca- riedade humana.

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