Diário do Amapá - 16/05/2020

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANAMELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANAMELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br nteressante observar como os humanos se comportam nas crises, como agora na COVID-19. Em razão das Mídias Sociais, ficou ainda mais fácil observar o fenômeno da busca de explicações para o que atinge a todos, sem exceções. Cada pessoa tem suas próprias convicções e, com liberdade, defende seus pontos de vista com maior ou menor empenho. Mas, exageros de alguns, oportu- nismos de outros à parte, a pandemia é real. Quem não tomar todos os cuidados estará em risco de contrair o vírus e até morrer. Já, por outro lado, o pandemônio causado pela pandemia é um fenômeno comportamen- tal, gerado por boa parcela da sociedade. Foi o inglês John Milton que, em 1667, cunhou o neologismo em seu poema épico "Paraíso Per- dido", escrito em período de muita agitação política e religiosa do século XVII, assim como estamos vivendo agora. Em 2012, foi lançado no Brasil o romance antiutópico "Pan- demônio", da escritora norte-americana Lau- ren Oliver, que também aborda o tema. Seja sob que prisma, a expressão supõe a vida na imaginária "capital do Inferno". Há quem acredite em "depurações" da humanidade. Em catástrofes que, de tempos em tempos, acontecem para dar uma "arru- madinha" na Terra. Alguns esotéricos e reli- giosos resgatam profecias de Nostradamus a Raul Seixas, passando por Bill Gates. E o mais interessante é que fundamen- tam suas teorias, encontram palavras, frases, indícios que soam como gran- des verdades. Alguns, justamente preocupa- dos com a sobrevivência depois da crise, optam pela teoria da conspi- ração. A China, que se tornou potência ameaçadora do ponto de vista dos negócios, estaria usando o vírus para o "reequilíbrio" do merca- do internacional em um momento que a balança lhe é desfavorável. Para estes mais céticos, chineses são capazes de tudo para ganhar dinheiro. A fantasia é de que desenvolveram o vírus para, já com a cura descoberta por eles mesmos, comercializar o remédio em todo o Mundo. Sem falar da venda de máscaras, testes e outros produtos para o enfrentamento do mal que eles mesmo teriam causado. Há os militantes políticos que estão con- vencidos - e tentam nos convencer a todo cus- to -, que a China desenvolveu uma arma quí- mica, um vírus de laboratório para dominar de vez o Planeta. Implantar o comunismo na ladeia global. E esta tese vai muito além ape- nas do aspecto comercial. Quem sabe, até mesmo, esses incontroláveis chineses preten- dam conquistar também o universo? E nossos ativistas políticos, circunspec- tos, advertem com as sobrancelhas cerradas: "Comunistas comem crian- cinhas!". Os humoristas estão se divertindo, os cartunistas fazendo do traço a tro- ça, todos nos oferecendo momentos de diversão em meio a tanta tristeza e temor pela contaminação e suas durasconsequências. Entre ascentenas de piadas que circulam, está a que afir- ma ser cientificamente comprovado que o uso intenso de alho evita a COVID-19. Afinal, todas as pessoas ficarão a mais do que um metro e meio de você... A imprensa também não escapou dos ata- ques de alguns nesta pandemia, vítima da incompreensão de certas correntes desde a últi- ma campanha eleitoral. Para um determinado grupo, o noticiário é tendencioso e só contem- pla os que morreram. Os que seguem vivos e saudáveis não têm sido mencionados. Também não tem informado os inúmeros casos de remé- dios caseiros capazes de evitar, ou até mesmo curar, qualquer problema causado pelo novo coronavírus. Tem que afirme que um determi- nado chá, feito pela avó de um vizinho, tem sido injustiçado ao não aparecer nas manchetes da mídia. dia 15 de maio é um feriado estadual dedicado à memória de Francisco Xavier da Veiga Cabral, o chamado “Cabralzi- nho' e rememora a invasão francesa da Vila do Espírito Santo doAmapá (atual cidade de Ama- pá), ocorrida há 124 anos. No amanhecer do dia 15 de maio de 1895, o vilarejo situado no terri- tório contestado pelo Brasil e pela França, foi surpreendido por tropas francesas comandadas pelo capitão Lunier. Ainvasãofoi uma tentativa extrema dos fran- ceses para prender, o comerciante Veiga Cabral, o Cabralzinho, líder de ummovimento político e militardenominado“Triunvirato”,contrarioàpre- sençafrancesa naregião.Soba liderança doTriun- virato e comandados por Cabralzinho, os brasi- leirosreagiram àagressãoe muitasvidas inocentes foramceifadas,poisosmilitaresfrancesesusaram de extrema violência, assassinando cruelmente crianças, mulheres e idosos da pequena vila. Embora tenha sido condecorado como “O Herói doAmapá” e se tornadoherói da república brasileira, Cabralzinho não conseguiu sozinho esse feito. O povo da vila assumiu a defesa do lugar e lutou bravamente para rechaçar os inva- sores, muito embora os mesmos estivessem em maior numero e maisbem armadose equipados. Não se tratava de uma saga patriótica, mas de uma luta pela sobrevivência que colocava sob confronto vários interessese que envolviambra- sileiros, franceses, mercenários, aventureiros, forasteiros, indígenas, religiosos, entre outros. Omassacre genocida da vila doEspírito Santo doAmapá repercutiusem todoo paíse reverbera no exterior a pontode Brasil e França retomarem as negociações no campo diplomático e final- mente, no dia 1° de dezembro de 1900, sobarbi- tragem do governo da Suíça, o ganho de causa foi dado ao governo brasileiro através do Laudo Suíço, quer reafirmou e referendou as determinações do Tratado de Utrecht, assinado entre Portugal e França em 1713 e que definia o rio Oiapoque como limite geográfico entre o Brasil e a Guiana Francesa. Encerrada a questão do Contesta- do, as atenções se voltaram com o passar do tempo para a inicial avalia- ção e posterior julgamento, chegando mesmo à condenação da figura de Cabralzinho. As polêmicas foram gra- dativamente se avolumando e se acirran- do à medida que os relatos e pesquisas de estudiososrenomadoscomoEmílioGoeldi, começaram a descortinar a face doherói repu- blicano, a partir da coleta de depoimentos de sobreviventes do massacre ocorrido naquela manhã sangrenta de 15 de maio de 1895 na Vila do Espírito Santo doAmapá. Seus caudatários e defensores exaltam seu espírito de liderança, comportamento inquieto e vocação guerreira e revolucionária. Para esse segmento,Cabralzinho, filhode uma família liga- da à Cabanagem e aos primórdios do republica- nismo no Pará, foi um dos expoentes do Partido Republicano Democrático (PRD), e assumiu a liderança da oposição ao governo paraense, não economizando esforços para a sua derrubada por meio de levantes golpistas. Depois de fugir para os EUA, onde se apaixonou pelo republi- canismo ianque, retornou para o Brasil e no começo dos anos de 1890, fugiu novamente do Pará para a região do Contestado franco-brasi- leiro. Para seus inquisidores ele não passou de um farsante que se consagrou em cima do esforço coletivo e que a República brasileira, então recém-nascido nascida, nabusca por fei5osheroi- cos que a legitimassem ao mesmo tempo em que sepultassem definitivamente a monarquia,fabricou seus mitos e heróis, entre estes o“bravo” e “intrépido”Vei- ga Cabral. Dosquestionamentos, pas- sandopela contestação e chegandoao achincalhe e à execração, a figura do herói sofreu ranhuras significativas e asparedesdosseus feitosseencheram de infiltrações e fissuras, deixando de ser glorificado para servir de piada e chacotas, algumas delas de tremendo mal gosto. O debate foi se acalorando e atraves- sandodécadasaté ultrapassarumséculodes- de o agora distante 15 de maio de 1895, sem que as polêmicas refreassem. Pelo contrário, ganharammaiscombustãocomodesenvolvimento de pesquisasacadêmico-científicas levadas àefeito sobretudo emBelém e, com o advento da Univer- sidade Federal doAmapá (UNIFAP), aspesquisas historiográficasdesenvolvidasemnível local, fize- ram da questão do Contestado e do verdadeiro papel de Cabralzinho uma das pautas recorrentes e renitentes, saindo do âmbito da academia para ocupar espaços no circuitomidiáticoe passando a comporo imagináriopopulareocotidianodasocie- dade amapaense, em seus diferentes segmentos. Cabralzinho é semdúvida umpersonagemhis- tórico dos mais admiráveis, assim como o são todososheróismitificados e cujos feitos suscitam questionamentos. Sendo produto de um contexto histórico em que a então nascente república bra- sileira buscava se afirmar e se consolidar simul- taneamente ao processo de definiçãode suasfron- teiraspara que o territórionacional pudesse atingir as feições, contornos e dimensões continentais que atualmente ostenta, sendo oquintomaior país do planeta em termos de extensão geográfica.

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