Diário do Amapá - 31/05 e 01/06/2020

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANA MELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br / / s discípulos procuravam a iluminação, mas não sabiam o que era e como con- segui-la. Disse o mestre: - Não se pode consegui-la e nem agarrá- la. Vendo, porém, o olhar desanimado dos dis- cípulos o mestre continuou: - Não fiquem tristes, não é possível também perdê-la. A partir daquele dia, os discípulos estão em busca daquilo que não se pode perder, mas nem agarrar. O que será? Parece uma brincadeira, mas não é. Só uma pergunta para despertar a nossa curiosidade e sem a pretensão de saber mais do que os outros. A resposta em si pode ser simples, mas o que tem a ver isso com o domingo de Pentecostes que estamos celebrando? Uma coisa por vez. Talvez o que não podemos agarrar e ao mesmo tempo perder é o amor de Deus. Esse amor sempre será um “dom” oferecido e dado e, por- tanto, só pode ser reconhecido e acolhido. Esse amor não pode ser perdido, porque Deus nos ama sempre, também quando achamos não o merecer ou que ele se esqueceu de nós. Agora chegamos ao Divino Espírito Santo. Neste domingo, concluímos o Tempo Pascal e volta para nós, na liturgia, o evangelho de João do anoitecer daquele dia de Páscoa. A lei- tura dos Atos dos Apóstolos, com o vento e o fogo, é uma grande apresentação com imagens bíblicas da presença e da força de Deus. O importante é perceber o valor e a extraordina- riedade do “dom” do Espírito Santo. Por esse “dom” os apóstolos,a Comunidade-Igre- ja, os cristãos, afinal, são chamados a continuar a missão do próprio Jesus. Será essa, em primeiro lugar, uma grande ação de perdão e reconcilia- ção. O pecado de sempre e que deve ser perdoado, uma vez por todas, é o afastamento de Deus, o não reco- nhecimento do seu amor e da sua bondade. Qualquer pecado, na Bíblia, é sempre idolatria: de nós mesmos, de outros, do poder, do dinheiro, de alguma “ideologia” transformada em absoluto. A conversão é difícil porque sempre seremos tentados a ter medo de Deus, a fugir dele, em lugar de nos deixar amar por ele, ou trocá-lo com algo, ou alguém, que nos atrai porque ime- diatamente visível e, pensamos, compensatório. Não tem como competir. As coisas, os bens, as pessoas estão à nossa frente. Deus parece estar longe, muito acima de nós pobres mortais peregrinos neste mundo, ele todo-poderoso, exigente, cobrador...Melhor nos virar aqui embaixo. Depois... sabe-se lá. Perdoem a banalidade, mas aqui entra o papel único e “santificador” do Divino Espírito Santo, aquele que Jesus, no evangelho de João, chama de “defensor” - consolador, aquele que nos conduzirá no conhecimento da verdade (Jo 14-15). Por que “defensor”? O Espírito Santo vai nos ajudar a desmascarar os enganos dos que não são “deuses”, mas que se apresentam com todo o brilho possível, com todas as pro- messas de poder e felicidade. Do outro lado, o Espírito Santo nos ajuda a reco- nhecer como é o verdadeiro Deus, des- faz as falsas e distorcidas imagens dele e nos conduz a contemplar aque- la beleza que só pode ser do único Deus verdadeiro. Aos poucos, nos caminhos da vida, o Espírito Santo abre os nossos olhos e o nosso cora- ção para que, superando os enganos, encontremos a Verdade que, já sabe- mos, não é um conjunto de doutrinas, mas uma pessoa: Jesus, Caminho, Ver- dade e Vida. É o Pai que nos atrai para que nos aproximemos de Jesus (Jo 6,44). Ele quer que “ninguém se perca” (Jo 6,39). O Espírito Santo nos faz compreender a Deus como o Amor que nos ama sempre porque é bondoso e misericordioso. Ainda é o Espírito Santo que nos confirma na fé para que digamos, sem medo ou vergonha, que “Jesus é o Senhor” (1Cor 12,3b). Tudo, portanto, a alegria da fé, do amor, da confiança, do perdão, tudo é “dom” de Deus. Não podemos perder o que nos é oferecido, cabe a nós acolher e agradecer. Que bom que seja assim, porque talvez a “fé” à qual, às vezes, nos agarramos tanto pode ser mais fruto das nossas ideias sobre Deus, do nosso orgulho, das sim- patias com santos e santas, que, mesmo, do Divi- no Espírito Santo. Os “catecúmenos” que eram batizados (e crismados) na noite de Páscoa, depois do batismo eram chamados de “ilumina- dos”. Assim deveríamos ser todos nós. pandemia da covid-19 está deixando nosso pequeno planeta desnorteado, perdido. Todos estamospreocupados e sentidos, sobretudo quem foi atingidomais de perto pela doença ou pelamorte. Eu estou aqui na Itália e somente nesses dias saímos do lockdown, mas sempre temerosos e com toda a precaução exigida pelas autoridades. Ao mesmo tempo, estou muito apreensivo com os meus amigos e amigas do Brasil. Quantos desabafose tristezas: “Padre, quan- tos amigos se foram!” Assimme disse, com dor no peito, uma senhora que perdeu o úni- co filho. Quanto sofrimento! Ao compartilhar tudo isso, eu também desabafo com o meu Deus: “Senhor, por que tudo isso? Por que tantas mortes? Por que, Senhor?” Não tenho uma resposta ime- diata e, assim, me mergulho na oração e reflexão. Nos longos silêncios, começam aflorar pensamentos como: “Deus não tem culpa de tudo isso, aqui somos nós os res- ponsáveis.” Como? Quando não estudamos suficientemente e não apostamos nas pes- quisas científicas para poder ajudar o ser humano a se libertar das doenças. Quando não respeitamos a própria natureza e não buscamos uma convivência pacífica. Quan- do fazemosda nossa vida uma simples especulação de mercado, reduzindo a própria vida a uma mercadoria. Este tempo de sofrimento e deserto nos ajuda a rever toda a nossa concepção da vida, rever os valores prioritários que temos e assumimosaté agora. Também nos iludimos com osavanços da ciência, da medicina, achando que a nossa vida não tinha limite e que a morte estava bem longe. Mas com a vinda de Covid-19, nossa expectativa de vida foi der- rubada e agora a morte está achando graça da nossa ciência. Portanto, essa catástrofe da pandemia pode nos ajudar também a res- gatar a sabedoria das Sagradas Escrituras, que nos diz: “Ensinai-nos a bem contar os nossos dias, para alcançarmos o saber do coração.” (Sl 89,12) Quero lembrar aqui sábias palavras do Papa Francisco: "Queridos irmãos e irmãs, na provação que estamos a atravessar, tam- bém nós, com os nossos medos e as nossas dúvidas como Tomé, nos reconhecemos frá- geis. Precisamos do Senhor, que, mais além das nossas fragilidades, vê em nós uma bele- za indelével... Agora, enquanto pen- samos numa recuperação lenta e fadi- gosa da pandemia, é precisamente este perigo que se insinua: esquecer quem ficou para trás. O risco é que nos atinja um vírus ainda pior: o da indiferença egoísta. Transmi- te-se a partir da ideia que a vida melhora se vai melhor para mim, que tudo correrá bem se correr bem para mim". E continua Francisco: "Começando daqui, chega-se a selecionar as pessoas, a descartar os pobres, a imolar no altar do pro- gresso quem fica para trás. Esta pandemia, porém, lembra-nosque não há diferenças nem fronteiras entre aqueles que sofrem. Somos todos frágeis, todos iguais, todos preciosos. Oxalámexa conosco dentro o que está a acon- tecer: é tempo de remover as desigualdades, sanar a injustiça que mina pela raiz a saúde da humanidade inteira! Aprendamos com a comunidade cristã primitiva: os crentes «pos- suíam tudo em comum. Vendiam terras e outrosbens e distribuíamo dinheiro por todos, de acordo com as necessidades de cada um» (At 2, 44-45). Isto não é ideologia; é cristia- nismo". (19.04.2020)

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