Diário do Amapá - 08 e 09/03/2020

/ / / Pouco conhecido pela maioria da população, “o cui- dadopaliativo (CP) consiste na assistência promovida por uma equipe multidisciplinar de saú- de que objetiva a melhoria da qualidade de vida do paciente e de seus familiares diante de uma doença que ameace a vida, por meioda prevenção e alívio dosofrimento, da identificação precoce, da avaliação impecá- vel e do tratamento de dor e demais sintomas físicos, psi- cológicos e espirituais” – essa definição é da Organização Mundial de Saúde (OMS). Nos últimos anos, entre os profis- sionais de saúde essa forma de atendimento tem ganhado for- ça, mas ainda sofre com a pou- ca disponibilidade no Brasil. Infelizmente, persiste a visão errônea de que os cuida- dos paliativos devem ser reali- zados somente em pessoas que se encontramnos seusmomen- tosfinaisdevida. Porém, quan- do uma equipe multidiscipli- nar formada por psicólogos, enfermeiros, fisioterapeutas, médicos, assistentes sociais e outros profissionais de saúde apresenta uma boa formação na área, ela pode cuidar da dor, da falta de ar, das náuseas, da fadiga ou de outros sintomas de forma mais estruturada, além de priorizar medidas de conforto e valorização da dig- nidade da pessoa acometida pela doença. Além de repercussõesfísi- cas, os cuidados paliativos têm como atenção aspectos emocionais, como medo, ansiedade e depressão, comuns em pacientes e fami- liares que vivem situações graves de saúde. Por fim, essa área cuida da espiritualidade do indivíduo, ou seja, o que lhe é sagrado. Diversos estudos científi- cos de grande qualidade demonstraram que, quanto mais cedo são aplicados os cuidados paliativos, melhor a qualidade de vida e o contro- le dos sintomas. Em algumas doenças, essaabordagem inclu- sive pode prolongar o tempode vida. Tudo isso, claro, também se reflete nos sistemas de saú- de, com o melhor gerencia- mento dos recursos existentes. Em suma, sendo que dessa for- ma, os cuidados paliativos agregam valor ao sistema de saúde, pois aumentam a quali- dade da assistência com redu- ção de custos. Um levantamento realiza- do pela Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), da qual sou vice- presidente, apontou que, dos mais de 5 mil hospitais no Brasil, apenas 10% disponi- bilizam um time de CP. Exis- tem 177 equipes no país. Des- sas, mais de 50% estão con- centradas na Região Sudeste. Apenas 10% (cerca de 13 equipes) atendem o Norte e Nordeste. São números bem aquém do desejado se compararmos com os apresentados por um estudo feito nos Estados Uni- dos em 2016 pelo Center for Advanced Palliative Care (CAPC). De acordo com ele, existemmais de 1 800 equipes atuando com cuidados paliati- vos por lá, cobrindo mais de 75% doshospitais commais de 50 leitos. Segundo dados da Aliança Mundial de Cuidados Paliati- vos (Worldwide PalliativeCare Alliance – WPCA, 2014), atualmente mais de 100 milhões de pessoas por ano seriambeneficiadasaoreceber cuidados paliativos (incluindo aí familiares e cuidadores).Mas menos de 8% dos indivíduos que precisam dessa assistência têm seu acesso garantido. Fora isso, segundo o ran- king“Quality of Death Index”, publicadopela revista TheEco- nomist em 2015, o Brasil é um dos piores países para morrer. Isso se deve ao baixo acesso a atendimento de cuidadospalia- tivos de qualidade e ao de medicamentos para o trata- mento adequado da dor. Melhorias no horizonte brasileiro Esse cenário ruim deve mudar nos próximosanos, prin- cipalmente após a pactuação da Resolução sobre Política Nacional de CuidadoPaliativo para o SUS, que ocorreuno dia 31 de outubro de 2018 durante a 8º Reunião Ordinária da Comissão Intergestores Tri- partite (CIT). A medida já foi publicada no Diário Oficial da União. Nós da ANCP trabalhamos intensamente desde janeiro de 2017 em conjunto com o Ministério da Saúde, o CONASS, o CONASEMS, o Conselho Federal de Medicina (CFM) e com dezenas de pro- fissionais e instituiçõesque são referências em cuidados palia- tivos, buscando a construção e estabelecimento dessa política pública oficial. Com ela, espe- ramosdar mais atençãoao tema dentro do SUS e orientar a implementação de novos ser- viços de cuidados paliativos. E novas abordagens estão sendo discutidas durante o VII Congresso Internacional de Cuidados Paliativos, que ocor- re de 21 a 24 de novembro de 2018emBelo Horizonte (MG). Lá, estarão presentes os mais influentes especialistas do cenáriopaliativista brasileiroe internacional. *André Filipe Junqueira dos Santos é médico geriatra e paliativista, vice-presidente da Academia Nacional de Cuida- dos Paliativos.

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