Diário do Amapá - 26 e 27/10/2025

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIODECOMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) - Fone: 96-3223-7690 www.diariodoamapa.com.br COMPROMISSOCOMANOTÍCIA |OPINIÃO | DIÁRIO DO AMAPÁ DOMINGO E SEGUNDA-FEIRA | 26 E 27 DE OUTUBRO DE 2025 2 E sta é a história de umquadro famoso de AlbrechDuerer. No fimdo século XV, dois amigos desejavamardentemente tornarem-se pintores. Precisavam estudar, mas ambos eram muito pobres. Por isso, decidiram que um ficaria trabalhado até que o outro se formasse, depois de vender os primeiros quadros, trocariam. Albrech foi o primeiro a estudar e o outro trabalhou num restaurante. O tempo passou. Quando chegou a vez do amigo estudar para ser pintor, ele percebeu que, devido ao duro trabalho, as suas mãos já não tinham mais a agilidade necessária para segurar a palheta e os pincéis. Teve que desistir do seu sonho. Certo dia, porém, o já conhecido pintor Albrech Duerer viu o amigo ajoelhado de mãos postas rezando. Comovido, o artista decidiu: "Jamais poderei devolver a essas mãos a agilidade que perderam. Mas posso demonstrar ao mundo a gratidão que sinto pelo que meu amigo fez por mim: pintarei essas mãos como as vejo agora. Pode ser que ao vê-las o mundo aprecie o que elas fizeram. Talvez sirvamde inspiração a outros para realizarematos de generosidade e desprendimento". No Sexto Domingo da Páscoa, continuamos com a leitura de um trecho do evangelho de João. Desta vez, o forte pedido de Jesus para “permanecer” unidos a ele é exemplificado através da alegria plena de quem entende o valor das suas palavras, do mandamento do amor e da amizade de quem está disposto a dar até a sua própria vida pelos amigos. O amor que Jesus pede é exigente. Ele nos deixa o mandamento de nos amarmos uns aos outros “como” ele nos amou (Jo 15,12). Um amor que reconhecemos total, fiel até o fim. Um amor que - sabemos - se antecipa também quando não é correspondido por nós. Isso nos parece tão acima das nossas forças, que somos tentados a desistir. O importante é que tenhamos Jesus à nossa frente, como modelo e não nos conformemos com a mediocridade e a acomodação. Renunciar de antemão a amar mais seria esvaziar e tornar inútil o amor de Jesus, seu exemplo, sua proposta de vida. Seria viver uma vida fechada em nós mesmos, talvez somente cobrando o amor dos outros sem nenhuma disponi- bilidade de nós mesmos tomarmos a iniciativa de amar. Por isso, Jesus diz que o amor maior é aquele de quem está disposto a dar a sua própria vida pelos amigos. Comefeito, o amor verdadeiro não temcomo finalidade a própria satisfação, o próprio orgulho, o reconhecimento e os aplausos. Esse amor deve ser um dom para os amigos – e até para os inimigos - como lemos no evangelho de Mateus (5,43-48) para que eles possam ter uma vida melhor, mais digna, ou simplesmente, mais humana e fraterna. Jesus sempre doou vida, quando curava os doentes, acolhia os ex- cluídos e oferecia o perdão aos pecadores para que pudessem recomeçar uma nova existência, tendo experimentado o seu amor compassivo emisericordioso. Cabe a nós não deixarmos passar as oportunidades que temos de doar algo praticando a solidariedade e a partilha. No entanto, não têmbensmateriais ou dinheiro que possamsubstituir omaior dompossível que é, justamente, a capacidade de sermos nós, ao mesmo tempo, o dom e os doa- dores. Jesus, que outras vezes chamou os discípulos para o serviço a ele, dessa vez os chama de “amigos” e não de servos, porque não é mais questão de obedecer às ordens de alguém superior, mas de colaborar livremente e por amor ao projeto de salvação do Pai que ele veio manifestar. Por fim, Jesus diz que não foram os discípulos a escolhê-lo, mas foi ele a chamá-los ao seguimento para serem enviados e produzir muitos frutos de paz e justiça. Sendo assim, deveríamos agradecer muito por fazer parte da obra do Reino, deixar de pensar no que ganhamos ou perdemos fazendo o bem e fazê-lo porque é isso que dá sentido à nossa vida. Se o amigo do pintor AlbrechDuerer tivesse pensado antes e avaliado os riscos que corria, provavelmente não teria trabalhado tanto pelo amigo, mas então não seria mais uma amizade fiel à palavra dada. Talvez a força dessa generosidade lhe veio da oração e mereceu que as suas mãos orantes fossem imortalizadas numa obra que desafia os tempos. Rezemos pelos amigos e para sermos mais amigos ainda. ■ DOMPEDROCONTI E-mail: oscarfilho.ap@bol.com.br Bispo de Macapá Seria viver uma vida fechada em nós mesmos, talvez somente cobrando o amor dos outros sem nenhuma disponibilidade de nós mesmos tomarmos a iniciativa de amar. Por isso, Jesus diz que o amor maior é aquele de quem está disposto a dar a sua própria vida pelos amigos. As mãos que oram Q uantas pessoas me confessam, todos os dias, as injustiças que sofrem. Cada pessoa tem algo a reclamar, por exemplo, das incompreensões que recebe. A dor por não ser compreendida! Alguns que me falaram pessoalmente das injustiças sofridas no trabalho e no âmbito familiar. Lembro-me, nesse momento, de uma pessoa que foi encarcerada porque foi acusada de ter cometido um homicídio. Naquele tempo, eu era coordenador da Pastoral Carcerária da Diocese de Macapá. Essapessoa insistia comigoda sua inocência.Nas visitas ao cárcere, sempreoencontrava com a Bíblia na mão. Dizia-me que foi destruído até o profundo da alma e lhe restava somente a justiça de Deus. Confiava totalmente nela. Passaramuns anos e esse senhor de repente foi libertado, porque não tinhamprovas para acusa-lo do crime. Ele ficou feliz da vida por ter sido reconhecido inocente. Mas depois de um breve tempo de libertação, o homem soube que tinha um horrível câncer. Todo esse sofrimento do cárcere, da humilhação por um crime que não cometeu, favoreceu, pensou ele, a contrair essa terrível doença. Acompanhei-o. Um belo dia me disse: “Padre, cada vezmais só. Por que isso?Quemal eufiz para ter todas essas condenações? Eu clamo, gritoparaDeus e parece que nãome escuta. Estouperdido, padre!”Compar- tilhando a imensa dor desse irmão, sóme restava apelar à Palavra de Deus; e abrindo a Sagrada Escritura, lemos juntos o salmo 16. “Ouvi, Senhor, uma causa justa! Atendeimeu clamor! Escutai minha prece, de lábios semmalícia. Venha de vós o meu julgamento, e vossos olhos reconheçam que sou íntegro. Podeis sondar meu coração, visitá-lo à noite, prová-lo pelo fogo, não encontrareis iniquidade emmim. Minha boca não pecou, como costumam os homens; conforme as palavras dos vossos lábios, segui os caminhos da lei. Meus passos se mantiveram firmes nas vossas sendas, meus pés não titubearam. Eu vos invoco, poisme atendereis, Senhor; inclinai vossos ouvidos para mim, escutaiminha voz.Mostrai a vossa admirávelmisericórdia, vós que salvais dos adversários os que se acolhemà vossa direita. Guardai-me como a pupila dos olhos, escondei- me à sombra de vossas asas, longe dos pecadores, que me querem fazer violência. Meus inimigos me rodeiam com furor. Seu coração endurecido se fecha à piedade; só têm na boca palavras arrogantes. Eis que agora me cercam, espreitam para me prostrar por terra; qual leão que se atira ávido sobre a presa, e como o leãozinho no seu covil. Levantai-vos, Senhor, correi-lhe ao encontro, derrubai-o; com vossa espada livrai-me do pecador, com vossa mão livrai-me dos homens, desses cuja única felicidade está nesta vida, que têm o ventre repleto de bens, cujos filhos vivem na abundância e deixam ainda aos seus filhos o que lhes sobra. Mas eu, confiado na vossa justiça, contemplarei a vossa face; ao despertar, sa- ciar-me-ei com a visão de vosso ser.” Depoisde lermososalmo, nos abraçamos. Eleconcluiu: “Aminha vida não posso aposta-la nessemundo. Ele não me garante nada! Só me resta apostar a minha vida em Deus, porque é Nele que encontro a verdadeira justiça, é Ele que acredita verdadeiramente em mim!” Essa súplica do salmista é a súplica também, nesse caso, do irmão injustiçado. A inocência dele reflete a oração desse autor sagrado. E quantos hoje passam pela mesma realidade? Para aqueles que acreditam, Deus entra em cena na vida das pessoas e as guarda como as ‘pupilas dos olhos.’ Uma simbologia essa que reforça a esperança do ser humano desesperado. O centro dessa oração é a reclamação da inocência do autor do hino. Poderíamos dizer, comparando com as realidades atuais, que era uma maneira de recorrer à suprema cortedivina, através deuma confissãoeumjuramento totalmente transparente e puro da pessoa. Esse fiel intercede a Deus para que possa socorrê-lo em tirar da vida dele os prejuízos que os homens o sentenciaram negativamente. Essa intercessão do perseguido inocente começa com a celebração dos ‘prodígios’ de Deus que é rico em misericórdia na história da humanidade. Um Deus presente que defende as suas criaturas e, sobretudo, criaturas como esse senhor condenado. Continua depois o salmo, mostrando a ação dos inimigos do fiel intercessor que são parecidos a um leão e um leãozinho que armam uma cilada. A imagem da cilada quer revelar a crueldade dos inimigos e a fragilidade da vítima inocente. Perante essa trágica cena o suplicante dirige o seu grito desesperador a Deus. E não obstante essa crueldade humana se contrapõe a doçura de Deus: “Ao despertar, saciar-me-ei com a visão de vosso ser.” Assim sendo, o ser humano injustiçado tem uma garantia: a presença confortante de Deus seu defensor. ■ CLAUDIOPIGHIN E-mail: clpighin@claudio-pighin.net Sacerdote e doutor em teologia. O centro dessa oração é a reclamação da inocência do autor do hino. Poderíamos dizer, comparando com as realidades atuais, que era uma maneira de recorrer à suprema corte divina, através de uma confissão e um juramento totalmente transparente e puro da pessoa. O inocente grita “Senhor, socorrei-me!”

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