Diário do Amapá - 27 e 28/04/2025
ENTREVISTA PESQUISADOR |ENTREVISTA | DIÁRIO DO AMAPÁ DOMINGO E SEGUNDA-FEIRA | 27 E 28 DE ABRIL DE 2025 14 O antropólogo e professor Eduardo Brondízio, que leciona a disciplina de antropologia ambiental na Universidade deIndiana (EUA) e na Unicamp, receberá o Prêmio Tyler 2025, ummais importantes na área, conhecido o Nobel do meio ambiente. D iário doAmapá - Professor, quais os aspectos de sua pesquisa que têmmaior relação coma premia- ção recente no Prêmio Tyler?? Eduardo Brondízio - Por um lado, a interação entre desenvolvi- mento regional, mercados e mudanças ambientais e comunidades rurais na Amazônia, focado em respostas das ações coletivas e locais e como elas influenciam a realidade regional, incluindo a urbaniza- ção regional, e, por outro lado, abordo esses temas em nível global – como as mudanças globais afetam a qualidade de vida de sociedades humanas, a contribuição de populações indígenas e rurais para pro- dução de alimentos e a conservação da biodiversidade a urbanização no sul global. Diário - Quais os aspectos mais importantes, hoje, desta relação entre comunidades e a Amazônia? Brondízio - Este ano, a COP30 é um tema catalisador a dois ní- veis. Global, no sentido de que as últimas duas COPs não deram o avanço esperado, e os impactos climáticos estão ficando mais aparentes e inegáveis. Internacionalmente, há uma expectativa muito grande nessa COP em poder gerar um acordo mais efetivo para mudar o cenário atual de emissões de gases de efeito estufa, mas, também, de constituir um plano mais amplo para investi- mentos em adaptações às mudanças climáticas, priorizando as populações mais afetadas. Também é um momento de fragmen- tação na cooperação internacional, então há expectativa de ofe- recer um espaço para buscar convergências entre vários setores da sociedade em torno de ações mais concretas. Há um outro ní- vel onde a COP30 já vem tendo um papel catalisador, o da Ama- zônia e do Brasil. Existe esperança de mobilizar energia, colabo- rações e financiamento para reverter o quadro de deterioração social e ambiental da região. Os problemas ambientais e sociais da Amazônia oferecem um espelho da situação global onde mu- danças climáticas, degradação da biodiversidade e desigualdades sociais se autorreforçam.. Diário - Por que esse momento é importante para a Amazônia? Brondízio - A Amazônia, o Brasil e países vizinhos foram palco de avanços importantes nos últimos 30 anos, como a criação de áreas protegidas, demarcação de terras indígenas e criação de áreas de uso sustentável, que englobam, no Brasil, cerca de 45% da região. Esse avanço conseguiu garantir direitos para as comunida- des e tem sido fundamental em bloquear, pelo menos parcialmen- te, a expansão do desmatamento e das queimadas. Um outro avan- ço importante nesse período foi o da expansão e as inovações da sociobioeconomia, que vêm garantindo ganhos ambientais e a va- lorização do conhecimento local e da biodiversidade. Essa é uma economia gigante, apesar de invisível, que vem das populações, das florestas e rios da região. Diário - E qual o contexto em que esses avanços ocorrem? Brondízio - Esses grandes avanços vêm acontecendo lado a lado com a transformação da região pela expansão do desmatamento, mineração, infraestrutura e urbanização. Progressivamente, essas transformações estão criando uma sinuca para áreas indígenas e protegidas. Hoje, a expansão desordenada dessas atividades, além da expansão do crime organizado, representa uma ameaça à sus- tentabilidade desses territórios. As áreas que são protegidas estão sitiadas e viraram "ilhas". São efetivos para garantir governança am- biental dentro dos seus limites, mas não para impedir os impactos do que vem de fora. É uma prioridade hoje salvaguardar esses terri- tórios e dar condições às comunidades de avançar nos ganhos da sociobioeconomia. Outro elemento é a urbanização da região, só na Amazônia legal são 770 cidades. Anteriormente desarticuladas e pouco conectadas fisicamente, hoje as conexões interurbanas estão criando uma grade que irá definir a governança ambiental do terri- tório pelas próximas décadas. Hoje, as realidades urbana, rural e in- dígena se entrelaçam na região. Boa parte das áreas urbanas da Amazônia é das mais precárias do Brasil e também está sofrendo com as questões climáticas como seca, inundação e temperaturas extremas commuita intensidade, além de altos níveis de poluição de mercúrio, pesticidas e poluição do ar. Diário - Quais as condições destas cidades hoje, prin- cipalmente das capitais? Brondízio - Os dados do IBGE de 2022, mostram, por exemplo, que as ocupações subnormais dominam nas principais capitais da Amazônia, chegando a mais de 55% das ocupações em Belém e Manaus. Isso não pode ser esquecido, pois a maior parte da popula- ção da Amazônia Brasileira, quase 80%, vive nessas áreas. Além dis- so, as áreas urbanas têm influência direta nas áreas rurais e indíge- nas e na saúde da floresta e dos rios da região. A precariedade das áreas urbanas e rurais vem levando a um crescimento acelerado das economias ilegais e do crime organizado na região. Texto: CLEBER BARBOSA | Foto: IRANEI LOPES PERFIL Brondízio realiza pesquisas sobre a Amazônia há 35 anos e atua como umavoz internacional sobre a importância da valorização das comunidades ribeirinhas e dos povos tradicionais na conservação ambiental e nas políticas de sustentabilidade. BREVE BIOGRAFIA - Nascido no Brasil, Eduardo Brondízio é atualmente professor da Universidade de Indiana- Bloomington, onde dirige o Centro para a Análise de Paisagens Socioecológicas. E construiu uma carreira singular, dedicada sobretudo à compreensão das dinâmicas socioambientais da Amazônia. - O antropólogo e professor Eduardo Brondízio, da Universidade de Indiana (EUA) e associado ao Programa de Pós- Graduação em Ambiente e Sociedade da Unicamp, é um dos vencedores do Prêmio Tyler de Conquistas Ambientais 2025, frequentemente chamado de "Nobel do Meio Ambiente". - O prêmio reconhece a sua pesquisa inovadora sobre as interações entre comunidades locais e o meio ambiente, destacando a importância da participação dos povos indígenas e comunidades rurais na conservação e sustentabilidade, especialmente na Amazônia. REFLEXÃO “Compreender lutas socioeconômicas do povo amazônico é fundamental para resolver os aspectos ambientais e climáticos que afetam o bioma”, destaca o pesquisador. Eduardo Brondízio ■ Antropólogo brasileiro Eduardo Brondízio é laureado por estudo sobre aAmazônia | Divulgação Ascidadesda Amazônia já sofrempelas mudançasdo clima
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