Diário do Amapá - 06/08/2020

LUIZ MELO Diretor Superintendente ZIULANA MELO Diretora de Jornalismo Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o debate dos problemas amapaenses e do país. O Diário do Amapá busca levantar e fomentar debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional. ZIULANA MELO Editora Chefe MÁRLIO MELO Diretor Administrativo DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA. C.N.P.J: 02.401.125/0001-59 Administração, Redação e Publicidade Avenida Coriolano Jucá, 456 - Centro CEP 68900-101 Macapá (AP) www.diariodoamapa.com.br / / pisódios de pessoas que se julgam superiores e acima da lei, infeliz- mente têm se tornado comuns na sociedade brasileira. Num país marcado por um histórico de analfabetismo e negação da educação, sobretudo a camadas mais pobres da população, atitudes como essas apresen- tam-se como reflexo de um histórico de desigualdade que para alguns infelizmente é considerado natural. Há pessoas que se consideram superiores e com a prerrogativa de humilhar publica- mente aqueles que se consideram inferiores. O fato de ter trilhado um caminho de con- quistas no horizonte da formação e no cam- po profissional ao invés de funcionar como um indutor de solidariedade e humanismo, converte-se em motivo de egolatria e justi- ficativa para a manutenção da desigualdade. É fato que ocorreram falhas nessa trajetória formativa, sobretudo no que diz respeito à formação humana. E faz muito sentido refle- tir sobres questões como essas em um momento histórico de desvalorização das ciências humanas, com desculpa de que são inúteis. A falta desses conteúdos, ou o seu desprezo na formação humana parece mostrar de imediato os seus efeitos desastrosos. Com razão afirmou Schope- nhauer que o ser humano é o úni- co animal capaz de fazer mal ao seu semelhante e outros seres sim- plesmente pelo fato de vê-los sofrer e regozijar-se com esse sofri- mento. E a coisificação de seres não humanos também foi alvo das críticas de Schopenhauer, pois animais não podem ser considerados meros meios para quaisquer fins. Buscou mostrar com isso que a moralidade não pode ser a da própria conveniência e apenas a dos semelhantes. Exige-se submissão e respeito em nome de uma suposta superioridade conquistada em nome de uma meritocracia, cuja igual- dade de oportunidades, que deveria ser a sua base é, em grande parte ilusória. E o fato de dizer em grande parte, é justamente para fazer uma ressalva àqueles que enfren- tam e todo tipo de preconceito e difi- culdades para superar enormes bar- reiras e concluir um curso superior, conquistar um trabalho digno e continuar lutando por uma vida digna. Uma das principais razões que podem ser buscadas para explicar esse ódio descabido contra os menos favorecidos está na insegu- rança. O medo de perder privilégios injustos provoca atitudes reacionárias estúpidas, que agridem, assolam e afron- tam a dignidade humana. Que mérito existe em manter uma pretensa superioridade em nome de anos de estudo cujo acesso foi nega- do aos mais pobres? Por que continuar sendo parte do problema, quando o dever ético nos obriga a ser parte das soluções? O que eu e você podemos dizer e fazer para que essa realidade seja transformada e o verdadeiro respeito pela humanidade impe- ça que atitudes irracionais não voltem a se repetir? estado de calamidade instaurado pela pandemia da COVID – 19 alavancou uma necessária onda de “teletrabalho” embusca de prevençãoe proteção contra o vírus e, nesta onda, trouxe-se uma série de alterações na dinâmica da prestação de serviços. Nesta dinâmica está o pagamento de benefícios, entre eles, por assimdizer, oVale-Refeição, tão usual e tão rotineiro que sua natureza deixou de ser questionada. Vale lembrar que o teletrabalho já vinha posi- tivado na CLT desde novembro de 2017 pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), mas certamente foi a quarentena quem trouxe tal regi- me à consciência prática e massiva de empre- gadores e empregados e o fez de forma abrupta, para não dizer estabanada.Esta falta de transição, carência de estratégia, é oriunda do fato de que os contratos atingidos pela exigência do teletra- balho já estavam em curso e com direitos apli- cáveis decorrentes do próprio contrato, da Lei e de instrumentos normativos (Convenção Cole- tiva e eventualmente Acordo Coletivo) que, até então, ainda vigoravam no mundo arcaico da indústria e do chão de fábrica. Verdade seja dita, o Legislador tem se esforçado para adequar o Direito do Trabalho às atuais formas de produ- ção, não mais tão estagnadas,mas é neste cos- tume e tradição já enrugados e atrofiados pelo tempo que está o Vale-Refeição e, na forçosa mudança do trabalho executado no estabeleci- mento empresarial para as residências do traba- lhador é que se precisa, novamente, resgatar a natureza deste auxílio. Ora, o Vale-Refeição, ou, genericamente, o auxílio refeição, não tem outra natureza senão a indenizatória. Trata-se de parcela paga pelo empregador para o empregado trabalhar, para oempregado ter subsidioa um custo decorrente de sua prestação de serviço longe de sua casa, custo este que se manifesta na saída do trabalhador de sua residência e na necessidade do obreiro ter de se alimentar fora de sua moradia. Para trabalhar e se alimentar nos arredores da empresa o trabalhador recai em custos, por vezes tão exces- sivos que, não fosse o vale refeição, seu salárioestariatotalmente corroídoaofinal do mês. Diz-se aqui o óbvio para enfatizar que as estratégias criadas pelo Legislador para assegurar a natureza indenizatória do Vale- Refeição não estão acima do conceito, não são em si a definição doVale-Refeição, isto,porque, opagamentovia cartãoouempresa especializada no serviço de alimentação ou, ainda, a própria inscrição do empregador no PAT (Programa de Alimentação do Trabalhador) são formalidades e veículos delineadores da indenização e formas de evitar fraudes e excessos de empregadores que pagavampor vezes valores maiores de Vale Refeição que de salário para fugir, ilicitamente, dos encargos trabalhistas. Pois bem, como dito, o Vale-Refeição tem natureza indenizatória e, se não há o dano, se não há o que ser reparado, não há o que se inde- nizar. Se o trabalhador não recai no custo extraordinário de se alimentar fora de sua resi- dência, se o trabalhador não temmais um custo para ir trabalhar, deixa-se de existir o dever de se pagar o Vale Refeição. Esta colocação é tão logica quanto legal. O § 2º do artigo 457 da CLT explicitamente garante que o auxílio alimentação, ainda que pago habitualmente, nãoseincorpora ao contrato de trabalho, assim comonão é base de incidência de qualquer encar- go, trabalhista ou previdenciário. Veja, a disposição da Lei, a rigor, é desnecessária, uma vez, como dito, que a essência do Vale-Refeição é indenizatória. Não nos parece restar dúvidas, por- tanto, que no regime do teletrabalho não se faz necessárioou exigível o paga- mentodo Vale-Refeição, salvose em ins- trumento normativoou contratualmente tal parcela estiver fixada ao teletrabalhador. Esta é a premissa da exigibilidade e o princípio do Vale-Refeição. Porém, para bagunçar esta lógica, a MP 936/2020 que autorizou reduções salariais e sus- pensões contratuais (já convolada na Lei 14.020/20) e, a própria MP 927/2020 que inau- gurou a série de regimes de teletrabalho na pan- demia, fixaram, quando trataram das suspensões contratuais, que o empregador deveria manter todos os benefícios ao empregado - o que gerou questionamentos se os contratos migrados ao tele- trabalho deveriam também carregar oVale-Refei- ção, como benefício que supostamente pode ser. A bagunça não parecer ter razão, pois, como dito, a garantia dos benefícios foi posta aos contratos suspensos, como forma de minimizar a precari- zação da medida – da suspensão contratual sem pagamento de salários, não ao teletrabalho. Ade- mais,pode-se questionar o conceitode “benefício” dado por alguns ao Vale-Refeição, pois, como sabido, a indenização não vem acrescentar um bem ao trabalhador, mas reparar um dano.

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