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LUIZ MELO

Diretor Superintendente

ZIULANA MELO

Diretora de Jornalismo

Circulação simultânea em Macapá, Belém, Brasília e em todos os municípios do Amapá. Os

conceitos emitidos em artigos e colunas são de responsabilidade dos seus autores e nem

sempre refletem a opinião deste Jornal. Suas publicações são com o propósito de estimular o

debate dos problemas amapaenses e do país. O

Diário do Amapá

busca levantar e fomentar

debates que visem a solução dos problemas amapaenses e brasileiros, e também refletir as

diversas tendências do pensamento das sociedades nacional e internacional.

ZIULANA MELO

Editora Chefe

MÁRLIO MELO

Diretor Administrativo

SISTEMA DIÁRIO DE COMUNICAÇÕES LTDA.

C.N.P.J: 02.401.125/0001-59

Administração, Redação e Publicidade

Avenida

Coriolano Jucá, 456 - Centro

CEP 68900-101 Macapá (AP)

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www.diariodoamapa.com.br

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erto dia um homem soube que Jesus esta-

va para visitar a sua casa. – Virá mesmo

ter comigo? Na minha casa? – pensou. E

ficou preocupado. Correu para cá e para lá nos

quartos, na cozinha,noquintal. Subiu até o telha-

do para conferir. Reparou as coisas com outros

olhos. Tudo estava sujo, desarrumado, feio,cheio

de bugigangas inúteis. – Falta até o ar – disse.

Mas não desanimou. Abriu portas e janelas e

começou a maior faxina da sua vida. No meioda

nuvem de poeira,que logo se levantou, apareceu

uma pessoa para ajudá-lo. Era tanto trabalho que

não tiveram nem tempo para conversar, mas em

dois tudo era mais fácil.Jogaramfora muitascoi-

sasvelhas, amontoaram e queimaram uma mon-

tanha de lixo. Esfregaram os pisos, limparam os

vidros das janelas, descobriram ninhos de bara-

tase esconderijode ratos. Ohomemdizia: - Nun-

ca vamos acabar &ndas h;. O outro respondia: -

Falta pouco!– Trabalharam semparar o dia intei-

ro. Aos poucos,finalmente, a casa brilhava; pare-

cia nova. Já estava anoitecendo quando os dois,

exaustos, foram para a cozinha e arrumaram a

mesa. – Agora Jesus pode vir – disse o homem

suspirando - - Eu já estou aqui - respondeu o

outro – Senta-te à mesa e janta comigo! -.

Apáginados discípulosde Emaús, queencon-

tramos neste terceiro Domingo de Páscoa é bem

conhecida. Para o evangelista Lucas ainda é o

“primeiro dia da semana” – o dia da Ressurrei-

ção - um dia tão longo que nunca parece acabar.

Chega a noite,masainda tem tempo para

voltar a Jerusalém, encontrar os Onze

reunidos e contar o que tinha aconteci-

do. Tem a arte do narrador naquelas

palavras cheias de tristeza e alegria,

desânimo e ardor, cansaço e energia,

mistério e revelação. Um resumo da

experiência docaminhoa ser feito por

todo discípulo. Por nós também, se

queremos sair da tentação da desistên-

cia e das nossas obstinadas e inúteis

explicações. Não tenho dúvida que a

maior dificuldade para entender a alegre n

otícia do Evangelho esteja em nossas

“ideias”, na nossa pretensão de explicar tudo,

de encaixar Deus e o seu agir em nossos racio-

cínios limitados e, na maioria das vezes, pre-

conceituosos. É o famoso: “Nós esperávamos”

dosdoisdiscípulosde Emaús.Em resposta Jesus

lhesdiz que eram “sem inteligência e lentospara

crer em tudo o que os profetas falaram”.

Paradoxo, em tempos de bombas “superinte-

ligentes”, nós continuamos fechados, semodese-

jo e a disponibilidade para entender as palavras

de Jesus. Ele sempre tem a paciência de explicar

de novo, de fazer arder o coração de quem lhe

presta atenção. Masnós continuamosdistraídos;

caminhamos na vida que passa sem meta segu-

ra, atraídos por promessas de bens individuais e

passageiros,fascinadospor ilusõesegoístas.Tudo

isso é muito diferente daquilo que Jesus ensinou

e praticou com a sua vida e a sua morte na

cruz. Ele tornou visível a misericórdia

do Pai, a sua bondade, sem exclusões,

com mais atenção aos pequenos, aos

doentes, aos sofredores.Nãodisputou

comosgrandes, os poderosos; oscha-

mou de mandões, opressores e rapo-

sas. Entre osdiscípulosdele nã ;odeve

ser assim. O único “poder” é o servi-

ço, é lavar os pés uns aos outros, como

ele, “o Mestre e Senhor” fez. A frater-

nidade do Evangelho é outra maneira de

viver,de organizar a convivência social, a

economia, a política, a paz entre os povos.

A estrada é longa e cheia de obstáculos, mas

Jesus caminha conosco. Não nos deixa, até reco-

nhecê-lo no gesto da partilha, da vida doada, do

sangue derramado. É a Eucaristia, a memória do

seu amor total. Assimos doisdiscípulos retomam

coragem, o coração, agora, vibra de entusiasmo,

sabem o que devem dizer e fazer. São outras pes-

soas.

Ao longodaquele caminho,foi necessária uma

grande “limpeza”: na vida, nas ideias, nas expec-

tativas deles. Jesus ajudou, sem alarde, desco-

nhecido, trabalhando junto, amigo. A casa ficou

limpa. O jantar uma festa. Sóuma história? Como

aqueladosdiscípulosde Emaúsou ofadigoso“tra-

balho” de todos nós? Quem não tem algo para

jogar fora? É lixo, não serve para nada. Faça uma

fogueira. Não tenha medo. Jesus ajuda.

oda vez que leio o jornal, fico triste em

ver quantas mortes violentas acontecem

todos os dias. É verdade, todos os dias!

Descobri também que as reportagens não rela-

tam quantos, de fato, morrem todos os dias.

Descobri, jornalisticamente, que aquilo que é

noticiado é somente, se posso dizer de manei-

ra bem aproximativa, quase uma amostra de

tantas mortes entre nós. Por exemplo, pelos

meus conhecimentos através dos contatos com

o povo da grande periferia de Belém, descu-

bro quantos jovens foram executados publi-

camente e os jornais nem chegam a mencio-

nar.

O interessante em tudo isso é ver o povo,

diante de cenas macabras, impotente e com

medo. Cala-se perante essa crueldade. Por que

isso? Porque, talvez, ele desconfia de tudo,

não se sente protegido, e a única maneira de

sobreviver é ficar calado. Uma resposta a tudo

isso pode ser encontrada no salmo 55 das

Sagradas Escrituras, em que mostra que esse

povo tem alguém de verdade que pode defen-

dê-lo. E quem é? Leia atentamente:

"Tende piedade de mim, ó Deus, porque

aos pés me pisam os homens; sem cessar eles

me oprimem combatendo. Meus inimigos con-

tinuamente me espezinham, são numerosos os

que me fazem guerra. Ó Altíssimo, quando o

terror me assalta, é em vós que eu ponho a

minha confiança. É em Deus, cuja promessa

eu proclamo, sim, é em Deus que eu ponho

minha esperança; nada temo: que mal me pode

fazer um ser de carne? O dia inteiro eles me

difamam, seus pensamentos todos são para o

meu mal; Reúnem-se, armam ciladas, obser-

vam meus passos, e odeiam a minha vida. Tra-

tai-os segundo a sua iniquidade. Ó meu Deus,

em vossa cólera, prostrai esses povos.

Vós conheceis os caminhos do meu

exílio, vós recolhestes minhas lágri-

mas em vosso odre; não está tudo

escrito em vosso livro? Sempre

que vos invocar, meus inimigos

recuarão: bem sei que Deus está

por mim. É em Deus, cuja pro-

messa eu proclamo, é em Deus que

eu ponho minha esperança; nada

temo: que mal me pode fazer um ser

de carne? Os votos que fiz, ó Deus,

devo cumpri-los; oferecer-vos-ei um

sacrifício de louvor, porque da morte

livrastes a minha vida, e da queda preser-

vastes os meus pés, para que eu ande na pre-

sença de Deus, na luz dos vivos."

O salmo inicia, dramaticamente, com a des-

crição de uma ação militar de perseguição. Os

protagonistas dessa agressão são inimigos sem

nomes que atacam sem piedade o autor da ora-

ção. E faz uma comparação com os caçadores

que estudam todas as possibilidades de como

acertar e pegar a sua caça: “Armam ciladas,

observam meus passos”. Perante uma situa-

ção horrível como essa, cheia de medo,

erguem-se preces a Deus para que liberte des-

sa desumana perseguição. Não tem alternati-

va em confiar no socorro de Deus, porque não

tem mais ninguém para apelar.

Esses perseguidores são apresentados como

‘povos’ talvez para exaltar a potência e a mul-

tidão. Ou talvez pela tentativa de transferir

sobre um plano nacional e comunitário um

acontecimento pessoal e individual. O autor

desse salmo passa depois da dramaticidade

das ameaças e perseguição à tranquilidade de

entrega a Deus, seu verdadeiro refúgio. Por

isso reza: “Vós recolhestes minhas lágri-

mas em vosso odre; não está tudo escrito

em vosso livro?” Justamente, porque no

grande livro da história junta todas as

palavras, as ações, as alegrias de toda a

humanidade e, sobretudo, escreve as

lagrimas que os perseguidores fazem

aos pobres.

Deus junta com carinho todas as lágri-

mas das vítimas e assim não caem no

vazio. Assim sendo, demonstra que as

lágrimas são aos ‘olhos’ de Deus realida-

des preciosas como a água, o vinho, o leite,

substâncias vitais que o peregrino no deserto

guarda no seu odre. Deus grava e conserva como

tesouros todos os sofrimentos da humanidade.

É a história do ser humano pobre e sofrido res-

gatado pelo seu Deus. Assim sendo, revela-se o

primado da soberania de Deus na história do

mundo: é Ele o autor e defensor da vida. Nin-

guém pode ameaçar a vida, não obstante a apa-

rente força dos poderosos deste mundo que

dominam o cotidiano. A Palavra do Senhor liber-

ta e no caminho da luz conduz os seus servos.

O papa Francisco, na audiência geral de 11

de janeiro de 2017, falou o seguinte: “Fé sig-

nifica confiar em Deus — quem tem fé, confia

em Deus — mas chega o momento em que,

confrontando-se com as dificuldades da vida, o

homem experimenta a fragilidade daquela con-

fiança e sente a necessidade de certezas diver-

sas, de seguranças tangíveis, concretas. Con-

fio em Deus, mas a situação é um pouco críti-

ca e eu preciso de uma certeza um pouco mais

concreta. E está ali o perigo! Então somos ten-

tados a procurar consolações até efêmeras, que

parecem preencher o vazio da solidão e aliviar

a fadiga do crer.”

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